Viagem Literária

Apenas uma maneira de despejar em algum lugar todas aquelas palavras que teimam em continuar saindo de mim diariamente.

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Location: Porto Alegre, RS, Brazil

Um gaúcho pacato, bem-humorado e que curte escrever algumas bobagens e algumas coisas sérias de vez em quando. Devorador voraz de livros e cinéfilo assumido. O resto não interessa, ao menos por enquanto.

Wednesday, May 06, 2009

CHE


Che é a primeira parte do filme de mais de quatro horas que Steven Soderbergh realizou sobre o guerrilheiro argentino. Apesar de concebido como um único longa, estúdio e distribuidora optaram por lançar a produção dividida em duas, facilitando aceitação do público. Essa primeira metade é focada nas ações de Che com a guerrilha cubana em Sierra Mestra, nas ações que levariam à Revolução Cubana e à queda do ditador Fulgêncio Batista. Soderbergh, sempre um diretor interessante, opta por uma abordagem distanciada e sem qualquer ideia pré-concebida sobre Guevara. Provavelmente com a consciência do fato de Che ser um personagem polêmico, capaz de despertar tanto admiração quanto repulsa, o cineasta evita tomar partido, limitando-se a apresentar os fatos de maneira quase documental, sem juízo de valor sobre o seu protagonista. Soderbergh não pretende dizer se Che é ou não um herói, optando por retratá-lo como um homem repleto de ideais e dedicado aos seus princípios, capaz de fazer o necessário para alcançá-los. Por exemplo, ainda que retrate Che como respeitoso aos inimigos e, principalmente, aos camponeses, o filme não foge de mostrar que ele poderia ser igualmente cruel sempre que acreditava ser preciso, como quando mata os traidores do Movimento ou quando esbraveja, em plena ONU: “Fuzilamos e continuaremos fuzilando!”. A abordagem é, ao mesmo tempo, a grande força e o calcanhar de Aquiles do filme. Se consegue apresentar um personagem complexo por sua dualidade e evitar a panfletagem, a pieguice e os lugares-comuns típicos de biografias, Che acaba resultando em uma obra fria, sem emoção, que jamais empolga ou apresenta algo de excelente. A narrativa é um pouco lenta e, por não buscar uma construção mais detalhada dos personagens, acaba cansando em alguns momentos, como no longo tiroteio em Santa Clara. Ainda assim, Benicio Del Toro demonstra novamente ser um grande ator (curioso é que foi sob o comando de Soderbergh que Del Toro teve a melhor interpretação de sua carreira, em Traffic), desaparecendo no papel do guerrilheiro, pelo qual levou o prêmio de melhor ator em Cannes. A opção de Soderbergh por intercalar as cenas na selva com o discurso de Che na ONU igualmente é eficaz, por ser capaz de jogar mais luz sobre as motivações do protagonista sem cair na utilização de um recurso que poderia soar apelativo, como a narração em off. Além disso, ao empregar a fotografia em preto e branco, com tons granulados, para as cenas na ONU, o diretor ainda ressalta a importância e a veracidade dos momentos em Sierra Mestra, como se somente ali, combatendo, o verdadeiro Che ganhasse vida e o resto fosse apenas uma parte do que ele realmente era. Ainda que alguns tenham reclamado da divisão do filme, a verdade é que cada uma das partes se sustenta por si só (ao menos a primeira, que foi a única que vi) sem maiores problemas: essa primeira fala sobre a vitória de Che e seus companheiros em Cuba, enquanto a segunda fará o contraponto, sobre a fracassada campanha na Bolívia que resultou na morte de Guevara. Che é, em essência, um bom filme, repleto de opções interessantes por parte de Steven Soderbergh, como o tom realista, realçado ainda pela utilização do espanhol. Mas ainda parece faltar algo, talvez a emoção que a história de uma das mais importantes figuras do século XX deveria ter.

Nota: 7.0

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