Viagem Literária

Apenas uma maneira de despejar em algum lugar todas aquelas palavras que teimam em continuar saindo de mim diariamente.

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Um gaúcho pacato, bem-humorado e que curte escrever algumas bobagens e algumas coisas sérias de vez em quando. Devorador voraz de livros e cinéfilo assumido. O resto não interessa, ao menos por enquanto.

Sunday, February 15, 2009

OPERAÇÃO VALQUÍRIA


OPERAÇÃO VALQUÍRIA (VALKYRIE)
De Bryan Singer. Com Tom Cruise, Bill Nighy, Tom Wilkinson, Kenneth Brannagh, Eddie Izzard, Tomas Kretschamnn e Carice Van Houten.


Desde o final da Segunda Guerra Mundial – e, de certa forma, durante –, o cinema retratou os nazistas como meros assassinos sanguinários. Sem exceção, Hitler e seus seguidores foram transpostos para as telas como monstros cruéis e sem sentimentos, longe de qualquer representação humana. É curioso, portanto, perceber como, nos últimos meses, diversos filmes apresentaram nazistas não como tais caricaturas da morte, mas como seres humanos, inclusive contrários às políticas do 3º Reich. É o caso de obras como Um Homem Bom, O Leitor e este Operação Valquíria.

Baseado em uma história real, o filme tem como cerne narrativo a mais famosa tentativa de assassinato de Adolf Hitler, perpetrada pelos seus próprios comandantes. O plano foi armado pelo Coronel Claus Von Staffenberg, um homem desiludido com as ações de seu líder, por acreditar que estas levariam a Alemanha às ruínas. Staffenberg uniu-se a uma série de representantes do alto escalão para pôr em prática um golpe de estado, apoiado em uma política criada pelo próprio Hitler: um plano de defesa denominado Operação Valquíria.

Dirigido por Bryan Singer (de volta a um trabalho menor após a mega-produção Superman – O Retorno) a partir de um roteiro de Nathan Alexander e Christopher McQuarrie (que já colaborou com Singer no excelente Os Suspeitos), Operação Valquíria já demonstra a preocupação com detalhes desde os primeiros minutos de projeção: Stauffenberg começa narrando em alemão o que escreve em seu diário, enquanto a voz em inglês lentamente sobrepõe-se à anterior, deixando claro ao espectador a origem dos personagens e da história. Trata-se de um recurso, de certa forma, desnecessário, mas interessante e honesto por parte de Singer, que demonstra respeito com a platéia.

O cuidado com os detalhes, aliás, não limita-se a isso: é fascinante acompanhar a recriação do 3º Reich de Adolf Hitler. Apesar das negativas do governo alemão para filmagens em locação, Singer e sua equipe conseguem trazer um alto tom de autenticidade ao filme ao construírem cenários como a sede da SS e suas dezenas de mastros com bandeiras, a Toca do Lobo, a casa particular de Hitler e até uma piscina com uma imensa suástica na qual o líder do Exército de Reserva pratica sua natação. Esse esmero com a recriação de época ajuda a transmitir o clima de ostentação característico do governo nazista, garantindo um alto grau de verossimilhança à produção.

Ao mesmo tempo, o roteiro apresenta o plano de forma extremamente eficaz. Ainda que não perca muito tempo em sua exposição, a explicação e o desenrolar da narrativa jamais deixam o espectador em dúvida sobre o que está acontecendo e qual o passo a passo dos conspiradores – uma conquista importante de Singer e seus roteiristas, que faz com que a platéia jamais canse da história. Por outro lado, Operação Valquíria é prejudicado por não dedicar alguns minutos a mais a um ponto crucial: a formação do grupo. Como e de que forma aqueles altos oficiais uniram-se para conspirarem contra seu maior líder é uma pergunta que permanece sem resposta à platéia.

O grande problema do roteiro, no entanto, é não buscar um retrato mais aprofundado ou complexo de seus personagens. Pelo que é apresentado por Singer e seus roteiristas, todos os conspiradores poderiam ser resumidos da mesma forma, praticamente sem qualquer diferenciação: oficiais a favor da Alemanha e contrários a Hitler. Nenhuma de suas personalidades é mais elaborada ou desenvolvida com cuidado e, se não parecem apenas caricaturas, isso deve-se quase totalmente ao talento de seus intérpretes, que fazem o possível para transformar os personagens rasos do roteiro em figuras, no mínimo, humanas.

Esse é o grande destaque do trabalho de atores do porte de Bill Nighy, Terence Stamp e Kenneth Brannagh, que, mesmo sem um material mais qualificado em mãos para desenvolverem suas caracterizações, são eficazes em suas atuações. O mesmo acontece com Tom Cruise, cujo Coronel Stauffenberg não passa de um homem apaixonado por seu país e disposto a sacrificar-se por ele. Ainda assim, o astro, que adota uma postura quase sem expressão, é eficiente em seu minimalismo: é fácil notar o nervosismo no rosto de Stauffenberg na saída do bunker após o atentado ou os sentimentos quando reencontra a família.

Em essência, porém, Operação Valquíria não se propõe a ser um estudo de personagens, mas um suspense capaz de gerar tensão. E o grande mérito da direção de Bryan Singer é exatamente conseguir manter essa tensão, mesmo que o espectador já saiba como a trama irá se encerrar - qualquer pessoa com o mínimo de consciência de História sabe o resultado do atentado. Singer constrói seu filme em uma crescente de nervosismo, além de sair-se muito bem na realização de cenas cruciais (a sequência do atentado, por exemplo, é um verdadeiro primor). Tudo isso faz com que a platéia esqueça, por vezes, o que sabe de antemão e se veja imerso na narrativa proposta pelo diretor.

E é exatamente por isso que Operação Valquíria é um filme a ser recomendado. Mesmo que não gere grandes discussões e não se preocupe em delinear mais os personagens, Bryan Singer constrói um thriller bastante eficiente, que prende a atenção até o final e gera bons momentos de tensão. E sempre é bom ver histórias reais baseadas em homens capazes colocar a própria vida em risco por um bem maior. Homens que, como vemos aqui, existiam até mesmo dentro do nazismo.

Nota: 7.0

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