Lançado diretamente em DVD no Brasil,
Valente é a primeira parceria entre uma das melhores atrizes do cinema norte-americano e um diretor europeu de comprovado talento. À simples leitura de uma sinopse, pode até soar estranha a presença tanto de Jodie Foster quanto do diretor Neil Jordan, pois um resumo do filme pode levar ao engano de que nada mais é do que um
Desejo de Matar feminino. E o erro de concepção não chega a ser condenável, uma vez que o enredo de
Valente conta a história de uma mulher que se torna espécie de justiceira após ser atacada por marginais, situação que tirou a vida de seu namorado. A premissa básica, no entanto, subverte a lógica de produções como as da série estrelada por Charles Bronson, onde a sede de sangue era o grande motor da trama. Em
Valente, como não poderia deixar de ser com estes envolvidos, o foco é o psicológico; em outras palavras, o interesse de Jordan, Foster e dos roteiristas Roderick Taylor, Bruce Taylor e Cynthia Morte é revelar como uma pessoa comum pode se transformar em uma assassina sem remorsos.
Valente, como se pode perceber, não é um filme com enredo repleto de reviravoltas ou situações surpreendentes. Na verdade, a estrutura da trama é até bastante simples. A verdadeira força do filme é a jornada da personagem principal: a narrativa é sobre uma pessoa, não sobre uma história. Assim que o espectador entende esta diferença,
Valente cresce exponencialmente. A trajetória de Erica Bain é construída com cuidado e sem pressa. Não há saltos no “tempo” e a platéia realmente compreende as ações dela. Não é preciso concordar, mas é fácil entender as razões que a levaram a fazer o que faz. Por ser focado basicamente no personagem,
Valente só funcionaria com uma atriz capaz de carregar um papel com peso dramático. Neste sentido, ninguém melhor do que Jodie Foster. Sempre intrigante e talentosa, Foster entrega nova grande interpretação, trazendo a platéia para dentro de sua jornada e tornando-a convincente. A atriz consegue apresentar duas Ericas completamente distintas (a do início e a do final do filme) sem perder a credibilidade. A luta, o conflito interno da personagem quando realiza as ações da segunda metade de
Valente, deixam claro que a antiga Erica ainda existe, mesmo que tenha sido “sufocada” pelos eventos que construíram aquela nova personalidade. É um belo trabalho de Foster, amparada por roteiro riquíssimo, que oferece uma personagem tridimensional e trágica. O ritmo é lento, especialmente no início, o que pode causar inquietação em alguns. Mas a cuidadosa (des)construção da personagem pedia por isso, assim como o relacionamento entre ela e o detetive (em bela atuação de Terrence Howard), também realizado de maneira convincente.
Valente tem seus problemas, como uma desnecessária subtrama envolvendo a ex-esposa do detetive e alguns momentos que exigem boa vontade do espectador, mas ainda é um belo filme. Neil Jordan acerta ao não julgar sua protagonista e os atos realizados por ela e compõe uma obra interessantíssima e potente. Um filme de ação com pessoas reais.
Nota: 8.0