Viagem Literária

Apenas uma maneira de despejar em algum lugar todas aquelas palavras que teimam em continuar saindo de mim diariamente.

Name:
Location: Porto Alegre, RS, Brazil

Um gaúcho pacato, bem-humorado e que curte escrever algumas bobagens e algumas coisas sérias de vez em quando. Devorador voraz de livros e cinéfilo assumido. O resto não interessa, ao menos por enquanto.

Friday, July 28, 2006

A Assombração

A primeira e única vez que Renan viu um fantasma foi numa quarta-feira à noite. Nada de chuva com trovoadas, nada de portas rangendo e sons estranhos. Em outras palavras, nada daquelas coisas que vemos em filmes. Ele simplesmente estava no sofá, assistindo televisão, quando ouviu uma voz:

- Tudo bem?

Claro que a reação de Renan foi a mesma de qualquer um. Espantou-se ao ver que tinha um homem de aproximadamente trinta anos ao seu lado. Não era transparente ou com luzes em volta. A única diferença para um ser humano normal era sua palidez.

- Quem é você? O que está fazendo na minha casa? – perguntou Renan, acreditando que era um assalto.

O espírito, que até então não havia se identificado como espírito, finalmente revelou-se como espírito.

- Sou um espírito.

Renan continuou calado.

- Não se assuste, porque só quero pedir uma coisa a você – disse o espírito.

Renan surpreendeu-se.

- A mim? O que eu tenho a ver com qualquer coisa?

- Já vou te contar, se você parar de agir como uma mocinha apavorada – respondeu o fantasma.

O fantasma percebeu que Renan estava assustado com tudo aquilo. O que é compreensível, já que não é todo dia que se recebe uma aparição do além em casa enquanto se assiste Big Brother na Globo.

- Você não veio me assombrar?

- Claro que não.

- Não vai puxar meu pé?

- Não.

- Nem ficar abrindo portas e ligando aparelhos eletrônicos? Arrastando correntes?

- Não. Por que eu faria essas coisas?

- Porque é isso que fantasmas fazem, ora – explicou Renan, como se aquilo fosse a coisa mais óbvia do mundo.

- É, eu sei – lamentou o fantasma, decepcionado. – Na verdade, é algo que nunca entendi.

Renan começava a se sentir mais tranqüilo com a presença sobrenatural, mas achou meio estranho o papo do fantasma. Perguntou:

- Como assim?

- Não quero fazer você perder seu tempo com minhas teorias.

- Teorias? Um fantasma tem teorias?

- Mas é claro – retrucou o fantasma, começando a caminhar pela sala. Ou flutuar, ou qualquer outra forma de locomoção das criaturas da natureza dele. – Por que eu não teria? Também penso.

- E qual é ela? A teoria?

- Não é teoria, só que eu não entendo toda essa história de assustar, de puxar o pé, de arrastar correntes, de mexer em objetos. Qual o objetivo de tudo isso?

Renan ficou calado, esperando ele continuar.

- Tá bom, vou explicar. Vejamos: fantasmas como eu ficam na terra quando deixaram algo inacabado no mundo terreno, não?

Renan assentiu com a cabeça.

- É o que dizem.

- Então. Pra que apavorar as pessoas que devem ajudá-las a terminar essas tarefas? Não entendo. Por que enrolar? Chega, diz logo pra essas pessoas no que precisa ajuda, agradece e vai embora! Por que ficar assustando? Só o que isso vai fazer é dificultar ainda mais o processo.

Impressionado com a lucidez do fantasma, Renan refletiu aquelas palavras. Fazia sentido e ele estava disposto a ajudar a entidade de outra dimensão.

- Sim, você está certo. E em que eu posso ajudá-lo?

- Ok, é o seguinte. Pra eu poder sair do mundo material eu tenho que terminar uma coisa.

- Sim, e o que é?

- É uma promessa que eu tinha feito e não consegui cumprir.

- Tudo bem. E o que era?

- Prometi que daria uma última noite de prazer à pessoa que amo.

Um sorriso brotou no rosto de Renan. Isso ele faria com prazer. Na verdade, foi o que ele disse:

- Isso eu posso fazer com prazer.

- Ah, que bom – exclamou o fantasma. – Significaria muito pra mim e pra ele.

Por alguns instantes, a frase passou despercebida pelos ouvidos de Renan. Mas então ele se deu conta.

- Ele?

- Sim, ele. Meu namorado. Ex, na verdade, porque agora já morri.

- Você é gay?

- Agora não sei mais. Mas quando vivo eu era.

- E você quer que eu dê uma noite de prazer ao seu namorado?

- Sim, bom que você concordou.

- Concordei nada – Renan vociferou, levantando-se. – Achei que era uma mulher, não um homem. Eu não sou gay, seu... seu Gasparzinho afeminado.

- Como assim? Quer dizer que não vai me ajudar?

- Óbvio que não! Eu não sou gay.

- E vai continuar não sendo – explicou o fantasma. – É só uma noite. Leve o meu amado a um estado de êxtase que eu não mais circularei por sua casa.

- Negativo, prefiro ser assombrado por toda a minha vida.

Os dois se olharam por breves momentos. O fantasma começou a se locomover, perguntando:

- Tem certeza?

- Claro. Sei que você não vai me machucar. Prefiro alguns sustinhos do que passar uma noite com um homem.

- Ok, você pediu pelo que vai receber.

- Sim, pedi.

- Nos vemos hoje de madrugada.

- Boa noite.

- Desejo o oposto pra você.

Sunday, July 23, 2006

A PASSAGEM

Tem crítica minha do filme "A Passagem" em www.cineplayers.com. Confiram.

Monday, July 10, 2006

Filmes de Maio

O QUARTETO FANTÁSTICO (THE FANTASTIC FOUR) – EUA, 2005 **
De Tim Story. Com Ioan Gruffud, Jessica Alba, Chris Evans, Micheal Chiklis e Julian McMahon.

O Quarteto Fantástico é uma leve mancha na lista de recentes incursões de super-heróis nos cinemas. Ao contrário dos bem-sucedidos X-Men e Homem-Aranha, por exemplo, a adaptação de Tim Story é prejudicada por um roteiro fraco, pouco preocupado com os personagens. Aqui, não há interesse na história, usando-a como mera desculpa para uma série de efeitos especiais, e o elenco jamais passa do mediano.

16 QUADRAS (16 BLOCKS) – EUA, 2006 ***
De Richard Donner. Com Bruce Willis, Mos Def, David Morse e Jenna Stern.

A primeira parceria entre Richard Donner e Bruce Willis, dois dos grandes nomes de ação do cinema americano, resultou em um filme eficiente, mas longe de genial. A idéia de a obra se passar em tempo real é eficaz, ainda que nada original, e a dinâmica entre Willis e Mos Def funciona. Há um bom equilíbrio entre a tensão e o humor, além de ótimas atuações (o antagonismo entre Willis e Morse é perfeito). Pena que a história abuse da boa vontade do espectador em certos momentos e se acovarde em sua conclusão.

MISSÃO: IMPOSSÍVEL (MISSION: IMPOSSIBLE) – EUA, 1996 ***
De Brian De Palma. Com Tom Cruise, Jon Voight, Ving Rhames, Emmanuelle Béart, Jean Reno, Vanessa Redgrave, Emilio Estevez, Kristin Scott Thomas e Henry Czerny.

Bom início para uma das séries mais bem-sucedidas dos últimos anos, Missão: Impossível funciona bem dentro de seus propósitos. Ainda que nem tudo convença, a obra traz um roteiro repleto de surpresas e um ótimo elenco. De Palma privilegia mais o clima de espionagem do que as cenas de ação, mas utiliza toda sua técnica para criar um dos momentos icônicos do gênero nos anos 90 (a invasão ao prédio da CIA). Longe de ser um grande filme, mas um bom entretenimento.

MISSÃO: IMPOSSÍVEL II (MISSION: IMPOSSIBLE II) – EUA, 2000 ***
De John Woo. Com Tom Cruise, Ving Rhames, Tandhie Newton, Dougray Scott, Rade Serbedzgia e Brendan Gleeson.

A mudança de tom com a troca de diretores é mais do que clara. Com uma história capenga, Woo se concentra naquilo que faz de melhor: cenas de ação inverossímeis e espetaculares. Em termos gerais, Missão: Impossível II é tão satisfatório quanto o primeiro, ainda que por motivos diferentes. Cruise mostra desenvoltura como herói e há momentos realmente empolgantes orquestrados pelo diretor. Para os fãs do gênero, é uma boa pedida.

O VÔO DA FÊNIX (THE FLIGHT OF THE PHOENIX) – EUA, 1965 ****
De Robert Aldrich. Com James Stewart, Richard Attenborough, Peter Finch, Hardy Kruger e Ernest Borgnine.

Infinitamente superior à sua recente refilmagem, este clássico de Robert Aldrich consegue realizar um interessante estudo de personagens. As mais de duas horas de duração permitem ao diretor dedicar um tempo precioso a cada um, familiarizando o espectador com eles. Como conseqüência, O Vôo da Fênix ganha força e carga dramática. Além disso, o elenco é ótimo, trazendo grandes nomes como Stewart, Attenborough e Borgnine.

MISSÃO: IMPOSSÍVEL III (MISSION: IMPOSSIBLE III) – EUA, 2006 ***1/2
De J. J. Abrams. Com Tom Cruise, Phillip Seymour Hoffman, Michelle Monaghan, Billy Crudup, Ving Rhames, Jonathan Rhys Meyers, Keri Russell, Simon Pegg e Laurence Fishburne.

Mesmo sendo o melhor filme da série, Missão: Impossível III deixa uma sensação decepcionante no espectador, pois passa perto de ser um grande filme de ação. Durante 2/3 da produção, Abrams consegue o que Brian De Palma e John Woo não conseguiram nos episódios anteriores: equilibrar roteiro e ação de forma surpreendente. A história funciona bem, transformando Ethan Hunt em um personagem mais humano. Além disso, há a presença de Seymour Hoffman, que cria um dos grandes vilões dos últimos anos. Pena que o terceiro ato traga uma reviravolta no roteiro que enfraquece não apenas o personagem de Hoffman, mas toda a história.

LILO & STITCH – EUA, 2002 ****
De Dean DeBlois e Chris Sanders. Com as vozes de Daveigh Chase, Chris Sanders, Tia Carrere e Ving Rhames.

Lilo & Stich não tem a mesma genialidade das obras da Pixar, mas é a prova de que animação tradicional ainda tem apelo, desde que conte com bons roteiros. Aqui, a história foge um pouco dos padrões da Disney e envereda até por caminhos politicamente incorretos. Além disso, Stitch é um personagem extremamente engraçado, verdadeiro achado dos criadores.

STITCH – O FILME – EUA, 2003 **1/2
De Tony Craig e Robert Grannaway. Com as vozes de Daveigh Chase, Chris Sanders, Tia Carrere e Ving Rhames.

Continuação bem mais fraca que o original, mas que ainda reserva bons momentos. O roteiro é menos inspirado, deixando a graça toda nas costas do personagem do alienígena. Desperta algumas risadas, mas é recomendável apenas para os fãs de Stitch.

VAMPIROS DE ALMAS (INVASION OF THE BODY SNATCHERS) – EUA, 1956 ****
De Don Siegel. Kevin McCarthy, Dana Winter, Larry Gates e King Donovan.
Um dos maiores clássicos do cinema de terror perdeu um pouco de sua força, mas continua exemplar. O argumento do filme dá base para uma parábola política sobre o momento vivido pelos EUA na época (pós mccarthysmo), o que apenas vem a acrescentar no ótimo exercício de tensão e suspense que é Vampiros de Almas. Com uma direção segura de Siegel e um roteiro objetivo, a obra tem um valor histórico e cinematográfico.

MARCAS DA VIOLÊNCIA (A HISTORY OF VIOLENCE) – EUA, 2005 ****
De David Cronenberg. Com Viggo Mortensen, Maria Bello, Ed Harris e William Hurt.

Considerado por muitos como um dos melhores filmes do ano passado, Marcas da Violência é um belíssimo estudo sobre a natureza humana. Cronenberg apóia-se no roteiro, mantendo uma estrutura tradicional para levantar questões sobre passado, identidade e os mais profundos instintos do ser. É um belo filme, com ótimas atuações e momentos poderosos, que apenas perde pelo final, uma solução deixa a desejar em uma obra tão complexa.

MARNIE – CONFISSÕES DE UMA LADRA (MARNIE) – EUA, 1964 ***
De Alfred Hitchcock. Com Tippi Hedren, Sean Connery, Diane Baker e Martin Gabel.
Se Marnie está longe das melhores obras de Hitchcock, ainda assim oferece vislumbres da inegável genialidade do grande mestre. A história é arrastada e o filme perde ritmo diversas vezes, mas há uma interessantíssima abordagem psicológica, trazendo profundidade à obra. Além disso, o elenco está bem, com destaque para Connery e para a surpreendente interpretação de Hedren.

A INVEJA MATA (ENVY) – EUA, 2004 **
De Barry Levinson. Com Ben Stiller, Jack Black, Rachel Weisz, Amy Poehler e Christopher Walken.
Mesmo com os nomes envolvidos, essa comédia não consegue fazer rir. O roteiro possui algumas boas idéias, mas a direção de Levinson é fraca e sem o menor timing cômico, arruinando a maioria das piadas. A única coisa que realmente funciona é a presença enérgica e divertida de Christopher Walken.

X-MEN: O FILME (X-MEN) – EUA, 2000 ****
De Bryan Singer. Com Hugh Jackman, Patrick Stewart, Anna Paquin, Famke Janssen, Ian McKellen, Halle Berry e Rebecca Romijn-Stamos.

X-Men é o filme que deu origem à febre de produções com super-heróis. Comandada por um Bryan Singer incrivelmente seguro, a obra consegue aliar um roteiro inteligente com ótimas cenas de ação. A história tem conteúdo, traçando uma interessante parábola sobre preconceito e intolerância. O problema é a curta duração, que obriga a deixar alguns personagens de lado. Ainda assim, um ótimo ponto de partida para a série.

X-MEN 2 (X2) – EUA, 2003 ****1/2
De Bryan Singer. Com Hugh Jackman, Patrick Stewart, Anna Paquin, Famke Janssen, Ian McKellen, Halle Berry, Brian Cox, Alan Cumming e Rebecca Romijn-Stamos.

Continuação praticamente impecável do já ótimo filme original. O roteiro não deixa de lado a inteligência, indo mais a fundo na questão das diferenças e discriminação contra as minorias. Singer constrói seqüências de ação ainda melhores e há mais espaço para o desenvolvimento dos personagens, que ficam marcados na mente do espectador. Mais do que um grande filme de ação, X-Men 2 é um grande filme.

TERAPIA DE AMOR (PRIME) – EUA, 2005 ***1/2
De Ben Younger. Com Uma Thurman, Meryl Streep, Bryan Greenberg e Jon Abrahams.

Terapia de Amor é um filme que vai ganhando o espectador pouco a pouco. A princípio pouco promissora, a obra demonstra maturidade e consciência ao tratar do relacionamento entre um casal com grande diferença de idade. Além disso, há momentos verdadeiramente engraçados, conduzidos pelas excelentes interpretações de Thurman e Streep. Despretensioso, mas competente ao extremo.

PALAVRAS DE AMOR (BEE SEASON) – EUA, 2005 **
De Scott McGehee e David Siegel. Com Richard Gere, Juliette Binoche, Flora Cross, Max Minghella e Kate Bosworth.

Produção completamente dispensável, Palavras de Amor sofre do mal da pretensão. O roteiro enrola e enrola sem chegar a lugar algum, tentando se configurar como um filme de arte. Mas a direção é insegura, os personagens mal construídos e Gere demonstra mais uma vez sua inépcia como protagonista.

O MERCADOR DE VENEZA (THE MERCHANT OF VENICE) – EUA/Itália/Luxemburgo/Inglaterra, 2004 ***1/2
De Michael Radford. Com Al Pacino, Joseph Fiennes, Jeremy Irons e Lynn Collins.

Esta adaptação do clássico de William Shakespeare demora um pouco para prender a atenção do espectador, mas revela-se uma experiência satisfatória. Apesar dos problemas de ritmo e da teatralidade excessiva, o texto do bardo inglês é maravilhoso e Al Pacino dá um show de interpretação como o judeu Shylock. Destaque também para a Portia de Lynn Collins, que se sai incrivelmente melhor que o intragável Fiennes.

Sunday, July 02, 2006

O Casal Perfeito

Esse é um texto que eu escrevi há uns dois anos. Ia publicar ele quando o cara se aposentasse, mas depois da atuação fenomenal de ontem, decidi antecipar. Simplesmente o melhor jogador que já vi jogar.

Já faz algum tempo que ela perambula por aí. Como ela surgiu, poucos sabem ao certo. Há rumores, alguns fatos perdidos, mas sua origem é meio nebulosa. Sabemos que faz mais de um século que ela circula por campos dos quatro cantos redondos dessa Terra, em uma incessante busca por sua alma gêmea. Claro, porque se todos têm direito a encontrar seu par perfeito, por que ela não?

Enquanto isso, ela corre. Enquanto isso, ela rola, contagiando multidões, rendendo fortunas e despertando sensações indescritíveis quando passa daquela linha branca e tira uma soneca no fundo das redes. Mas, quando faz isso, está apenas cumprindo seu papel, sua razão de ser. Está apenas sobrevivendo, enquanto procura por aquele que saberá tratá-la e respeitá-la da devida maneira.

Engana-se quem pensa que ao longo desse tempo ela nunca encontrou tal correspondente. Vários souberam cuidá-la e valorizá-la, dos mais diversos lugares do mundo. Só que ela enfrenta uma maldição que jamais será quebrada. Não importa o que aconteça, o relacionamento vai terminar. Seja de maneira amigável ou com brigas e decepções, a separação é certa e deixará lembranças na memória de quem acompanhou essa paixão, enquanto ela segue em frente atrás de abrigo nos pés de outros.

Em sua busca, teve diversos amantes, mas talvez apenas duas de suas relações podem ser consideradas perfeitas. A primeira foi com um negrinho malandro, abusado e cheio de ginga, o primeiro a mostrar ao mundo como ela deveria ser tratada. O tempo que passaram juntos foi mágico, e somente se encerrou porque ele não conseguia mais dar conta do recado. Coisas da idade.

A segunda paixão foi com um pibe argentino, que, extremamente ciumento, tomava ela para si e não havia como tirá-la de seu poder sem apelar para a violência. Ah, como ela amava aquela canhotinha e a gentileza que era dirigida a ela. Mas a relação terminou em decepção e, talvez por essa razão, ela não tenha se apresentado bem nos anos seguintes. Alguns acharam que estava chegando ao fim, mas era apenas o coração partido, se recuperando. Procurou achar a solução nos pés de diversos amantes, mas, apesar alguns casos promissores, não teve muito sucesso, como aquele com um italiano que acabou por desrespeitá-la na frente de bilhões de pessoas, em um momento decisivo da vida de ambos.

Até que surgiu um francês no meio de seu caminho, para a felicidade dela e o regozijo de milhões de pessoas. Poucas vezes se viu tamanha afinidade. Quem os enxerga juntos, não hesita em afirmar que eles nasceram um para o outro. Não é uma relação parecida como a que teve com o negrinho ou com o pibe. Também não é melhor nem pior, mas apenas diferente. Isso porque, depois da já citada decepção, ela cresceu, amadureceu e começou a ser mais exigente. Sua busca, conseqüentemente, tornou-se mais difícil.

Ele supre tais necessidades com categoria. Imponente, elegante, altivo. Ele demanda respeito por onde passa e ninguém ousa negá-lo essa reverência. Quando os dois se encontram, ela sorri. Muda a fisionomia, parece correr com mais facilidade e leveza. Abraça-se em seus pés e deseja não sair mais. Ela sabe que ali encontrou seu refúgio, seu abrigo. Sabe que, enquanto estiver com ele, jamais será maltratada.

Ele já afirmou que nada lhe traz mais felicidade do que acordar e saber que tem um encontro com ela. Como repudiar uma paixão dessas? Como não se contagiar com essa devoção e cumplicidade? Digo de novo, pois nunca é demais afirmar, que eles foram feitos um para o outro. Mágica, pode ser a palavra. Ele faz com ela coisas que nenhum outro fez, em momentos que parecem ter sido abençoados pelos deuses. Com ele, ela não rola, desfila. Com ele, ela não apenas existe, ganha vida. Enquanto acompanhamos essa perfeita união, invejamos ele por tê-la conquistado dessa forma. Invejamos por saber que jamais a trataremos da mesma maneira.

Mas, se ele a faz sentir bem, ela também lhe dá bons retornos. Tudo o que tem, tudo o que conquistou, deve a ela. Já possuiu o mundo em suas mãos, num capricho dos deuses que fizeram com que ela saísse de seus pés e duas flechas voassem daquela careca reluzente até o coração de um povo inteiro, destruindo as esperanças de milhões de pessoas do mesmo país do tal negrinho. Já foi eleito três vezes o melhor parceiro dela, entre milhares os pretendentes. Ela a levou ao topo e, como recompensa, ele a fez se sentir viva novamente.

Sim, sabemos que, assim como as outras, a relação vai acabar. O que nos conforta é saber que essa união, enquanto durar, não é exclusiva dos dois, é nossa também. Nós podemos acompanhá-la e admirá-la, apesar de jamais compreendê-la. Jamais repeti-la. Quando ela se encerrar, uma nova busca estará se iniciando. Ela sairá atrás de outro que a complete, que a ofereça o carinho e respeito que tanto merece. Da mesma forma que fez o negrinho, o pibe e agora esse francesinho.