Viagem Literária

Apenas uma maneira de despejar em algum lugar todas aquelas palavras que teimam em continuar saindo de mim diariamente.

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Location: Porto Alegre, RS, Brazil

Um gaúcho pacato, bem-humorado e que curte escrever algumas bobagens e algumas coisas sérias de vez em quando. Devorador voraz de livros e cinéfilo assumido. O resto não interessa, ao menos por enquanto.

Tuesday, October 31, 2006

Eis o poder da imaginação voraz:
Fechar os olhos
E ver ainda mais.

Cala a Minha Boca, Lula


Então o barbudo ganhou de novo. Admito que fiquei decepcionado e até com um pouco de raiva com o resultado das urnas. Raiva não do presidente – afinal, ele está no direito dele de concorrer de novo – mas do povo brasileiro, que simplesmente decidiu aceitar tudo o que aconteceu e continua acontecendo no governo, como se moral e ética fossem coisas obsoletas em nosso país.

É um sentimento de impotência um tanto desalentador. Isso porque, acho que pela primeira vez desde que comecei a votar, tinha a certeza absoluta de que Lula não era o melhor candidato. Defendi com unhas e dentes, através de textos e discussões orais, que o homem que surgiu como salvação do país há quatro anos não podia continuar no governo. Não depois de tudo o que se passou. Eu estava certo disso.

Mas o povo discordou de mim. A grande maioria da população brasileira – e não apenas a classe baixa e o nordeste, como muitos pensam – acha que o Brasil começou a funcionar. A grande maioria acha que está tudo bem, que Lula acertou mais do que errou. A grande maioria decidiu apoiar o líder do governo mais corrupto da história do país.

Ótimo. Espero que eles estejam certo e eu errado. Sinceramente. De coração. Nunca desejei estar tão errado em toda a minha vida. Quero que a minha convicção seja jogada por terra e pisoteada. Quero que, em outubro de 2010, eu possa escrever um texto pedindo desculpas a todos por não ter votado no ex-operário. Quero, nas próximas eleições, ser chamado de idiota, de imbecil, de ignorante.

O momento agora não é de construir críticas. Isso ficou no governo passado. Lula errou, e muito, mas decidiram dar-lhe uma nova chance. Então vamos começar do zero. Como? É simples: dando todo nosso apoio ao Lulinha paz e amor. Pode não ter sido o candidato que escolhemos, mas, já que agora não dá pra mudar mais, vamos ajudá-lo a fazer o Brasil sair dos baixos índices de crescimento, das altas taxas de juros e de toda a corrupção. Pelo menos no início desse novo governo, vou depositar minhas esperanças de que os problemas dos últimos quatro anos foram resolvidos e agora será só felicidade.

Claro, até Lula pisar na bola de novo. Até ele mentir pro povo outra vez. Porque, se ou quando isso acontecer, ele que se prepare. Os críticos de seu governo já estão treinados, afiados e apenas esperando um novo deslize. Esta nova chance que o Brasil deu ao presidente é pra fazer mais e melhor do que antes. O que, convenhamos, não é muito difícil.

39,17% da população brasileira está desejando firmemente estar errada. Então, de minha parte, faço um acordo. Agora, nesse novo começo, vou deixar o homem trabalhar. E, ainda que não acredite ser possível, torcer para ele calar a minha boca.

Silvio Pilau – 31/10/06




Monday, October 30, 2006

Sessão de Autógrafos

Então eu estarei dando autógrafos na Feira do Livro. Dia 03/11, às 18h, em algum lugar entre o Margs e o Banrisul.
Por quê? Porque alguém leu um conto meu, gostou, decidiu premiá-lo e colocá-lo num livro com outros vencedores. Isso ano passado. Mas esse ano todos os que ganharam vão ficar lá sentadinhos assinando e escrevendo dedicatória. Eu entre eles.
Quem quiser ir, está convidado. O livro é de grátis e o único custo pra quem for vai ser me homenagear comprando uma cerveja depois.

Wednesday, October 25, 2006

Verso sobre o Universo

Verso sobre o universo no verso de um papel
O parto que reparte as partes de uma vida
O santo que sustenta o que sente pelo céu
O recesso de uma peça que confessa sua lida

A dívida que cria dúvida e divide amigos
O jogo sob o jugo de uma ginga bela
A carga que o córrego carrega consigo
O ardor que vira amor e dor sem ela

O tira que atira o tiro de uma arma
O cara com a tara rara ao léu
O desatino que atina o destino e o carma
Verso sobre o universo no verso de um papel

Monday, October 23, 2006

Filmes de setembro

DESAFIO NO GELO (MIRACLE) – EUA, 2004 *** ½
De Gavin O’Connor. Com Kurt Russell, Patricia Clarkson, Noah Emmerich, Eddie Cahill, Patrick O’Brien Demsey e Michael Mantenuto.

Drama completamente clichê, mas bastante eficiente. É a trama dos desacreditados que se tornam campeões, aqui baseado em uma história real. Deixando de lado o patriotismo americano que triunfa sobre o comunismo da seleção russa e a trama previsível, Desafio no Gelo é divertido, com boa interpretação de Russell como o treinador e ótimas reconstituições das partidas.

A PANTERA COR-DE-ROSA (THE PINK PANTHER) – EUA, 2006 ****
De Shawn Levy. Com Steve Martin, Jean Reno, Beyoncé Knowles, Kevin Kline, Emily Mortimer, Henry Czerny e Jason Statham.

Injustamente menosprezada pela crítica, a refilmagem de A Pantera Cor-de-Rosa é suficientemente engraçada para merecer uma olhada. Martin apenas repete os trejeitos criados por Peter Sellers para o impagável Clouseau, mas o personagem continua arrancando boas risadas. Há momentos simplesmente hilários e sacadas criativas, além da hipnotizante presença de Beyoncé.

O SENHOR DAS MOSCAS (LORD OF THE FLIES) – EUA, 1990 ****
De Harry Hook. Com Balthazar Getty, Chris Furrh, Danuel Pipoly e James Badge Dale.

A direção amadora de Harry Hook é o principal problema desta adaptação da obra-prima de William Golding. Algumas das escolhas do cineasta são desnecessárias, prejudicando o ritmo da obra. No entanto, o elenco infantil está bem e o texto de Golding (um impressionante relato sobre os instintos e a natureza humana) consegue superar qualquer problema.

PARENTHOOD – O TIRO QUE NÃO SAIU PELA CULATRA (PARENTHOOD) –EUA, 1989 ****
De Ron Howard. Com Steve Martin, Mary Steenburgen, Dianne Wiest, Keanu Reeves, Jason Robards, Tom Hulce, Rick Moranis, Martha plimpton e Joaquin Phoenix.

Um belo e pouco conhecido trabalho de Ron Howard, Parenthood traz diversas visões sobre o relacionamento entre pais e filhos. Ainda que a mão do diretor tenha uma acentuada tendência para o melodrama, o roteiro e o elenco são bons o suficiente para criar momentos realmente tocantes, além de provocarem uma boa reflexão sobre as dificuldades – e prazeres – da paternidade.

CLOSER – PERTO DEMAIS (CLOSER) – EUA, 2004 **** ½
De Mike Nichols. Com Jude Law, Natalie Portman, Julia Roberts e Clive Owen.

Closer tem um dos melhores roteiros dos últimos anos. A história dos quatro amantes se destaca pela abordagem, com um amantes usando nada mais que a verdade para machucar o outro. Os diálogos são simplesmente fantásticos, com os quatro atores aproveitando-se da riqueza do material para criar personagens complexos e situações devastadoras. Some-se a isso uma direção elegante de Nichols e temos um dos grandes filmes recentes.

CINCO COVAS NO EGITO (FIVE GRAVES TO CAIRO) – EUA, 1943 ****
De Billy Wilder. Com Franchot Tone, Anne Baxter, Akim Tamiroff, Erich von Stroheim e Peter van Eyck.

Billy Wilder mais uma vez não decepciona, mostrando toda a sua versatilidade nessa história passada na Segunda Guerra. Com ótimos diálogos e situações divertidas e inspiradas, o mestre constrói uma história extremamente agradável de se assistir, ainda que não chegue perto de suas melhores obras. Tone está bem no papel principal, mas o grande destaque é mesmo Stroheim como Rommel.

SERENITY – A LUTA PELO AMANHÃ (SERENITY) – EUA, 2005 *** ½
De Joss Whedon. Com Nathan Fillion, Gina Torres, Alan Tudyk, Morena Baccarin, Adam Baldwin e Summer Glau.

Baseado em uma série de TV, Serenity tornou-se um filme cultuado nos EUA. Em parte justifica-se, pois é uma ficção científica de qualidade, com um grupo de personagens carismático e pelos quais é fácil torcer, além de trazer uma história, no mínimo, interessante. Pena que o diretor e roteirista Whedon acabe derrapando em alguns clichês. Anotem o nome de Nathan Filliion, ainda vai dar o que falar.

CARNE TRÊMULA (CARNE TRÉMULA) – Espanha, 1997 **** ½
De Pedro Almodóvar. Com Javier Bardem, Francesca Néri, Liberto Rabal, Angela Molina, José Sancho, Penélope Cruz e Pilar Bardem.

Primeira da série de obras-primas de um dos melhores cineastas da atualidade. Carne Trêmula é cinema da melhor qualidade, com uma história surpreendente e cheia de reviravoltas que jamais perde o sentido. Os personagens são bem construídos e todos os atores estão irrepreensíveis. Além disso, Almodóvar demonstra maturidade na direção ao conter os excessos e construir belíssimas cenas. Imperdível.

CÃO DE BRIGA (DANNY THE DOG) – EUA/França/Inglaterra, 2005 ***
De Louis Leterrier. Com Jet Li, Morgan Freeman, Bob Hoskins e Kerry Condon.

Cão de Briga tenta dar um novo caminho na carreira de Jet Li, em uma trama com menos ação e mais voltada para o personagem. Mas o ator não tem alcance dramático para um personagem com mais profundidade, fazendo com que as cenas mais íntimas beirem, por vezes, o risível. No entanto, Li mostra a que veio nas cenas de ação. Uma produção ambiciosa, mas que no final acaba funcionando como diversão descompromissada.

MENINA DOS OLHOS (JERSEY GIRL) – EUA, 2004 ** ½
De Kevin Smith. Com Ben Affleck, Liv Tyler, Raquel Castro, Jason Biggs, George Carlin, Jennifer Lopez, Matt Damon e Jason Lee.

O pior filme de Kevin Smith. Não há nada em Menina dos Olhos que mostre o espírito irreverente e a criatividade que fizeram de Smith um diretor tão cultuado. Aqui, tudo é sistemático e previsível, inclusive com derrapadas no melodrama. Nem os diálogos, sempre inspirados, destacam-se e Ben Affleck mostra, mais uma vez, sua inaptidão para papéis mais exigentes. Há um ou outro momento eficiente e presença da adorável Raquel Castro.

HUCKABEES – A VIDA É UMA COMÉDIA (I HEART HUCKABEES) – EUA, 2004 ***
De David O. Russell. Com Jason Schwartzman, Lily Tomlin, Dustin Hoffman, Jude Law, Mark Wahlberg, Naomi Watts e Isabelle Huppert.

Um dos talentos do cinema independente americano, David O. Russell faz em Huckabees seu filme mais ambicioso. Versando sobre temas filosóficos e sobre o verdadeiro sentido da vida, o cineasta reuniu um incrível elenco, que consegue manter o espectador sempre interessado. No entanto, o roteiro é por demais pretensioso, divagando e refletindo sem chegar a lugar algum. Merece méritos pela tentativa, mas o resultado é aquém do promete.

DIÁRIO DE UMA PAIXÃO (THE NOTEBOOK) – EUA, 2004 *****
De Nick Cassavettes. Com Ryan Gosling, Rachel McAdams, James Garner, Gena Rowlands, Sam Shepard e Joan Allen.

Uma das melhores histórias de amor produzidas pelo cinema. Esta obra simplesmente apaixonante consegue superar qualquer problema de previsibilidade ao apresentar personagens fascinantes e momentos repletos de pura emoção. Gosling e McAdams têm uma química perfeita, fazendo o espectador acreditar e se comprazer pelo sentimento do casal. Ótimos diálogos, personagens bem construídos, grandes atuações e direção sensível. Um filme apaixonante.

A PANTERA COR-DE-ROSA (THE PINK PANTHER) – EUA, 1963 ***
De Blake Edwards. Com Peter Sellers, David Niven, Capucino, Robert Wagner e Claudia Cardinale.

A primeira aparição de Closeau nos cinemas sofre por problemas de ritmo, com longas cenas que poderiam facilmente ser cortadas. O detetive é coadjuvante, mas são apenas as suas cenas que fazem de A Pantera Cor-de-Rosa um bom entretenimento. Sellers mostra que é um gênio da comédia, protagonizando situações hilárias que superam as falhas da obra.

UM TIRO NO ESCURO (A SHOT IN THE DARK) – EUA, 1964 ****
De Blake Edwards. Com Peter Sellers, Herbert Lom, George Sanders e Elke Sommer.

Segundo filme da série da Pantera Cor-de-Rosa e incrivelmente superior ao original. Agora Closeau é protagonista, o que resulta em um ritmo melhor e mais piadas. Sellers continua impagável, com um timing cômico absolutamente perfeito. A trama pouco interessa, como se nota ao final. O que vale são as situações criadas por Sellers e Edwards, que fazem de Um Tiro no Escuro uma grande comédia.

O EXPRESSO POLAR (THE POLAR EXPRESS) – EUA, 2004 *** ½
De Robert Zemeckis. Com Tom Hanks, Nona Gaye, Peter Scolari e Eddie Deezen.
Robert Zemeckis envereda pelo ramo da animação com este agradável filme de Natal. Em questões de história, a obra não tem nada de novo, trazendo a lição de que o Natal é uma época mágica para quem acredita. No entanto, a técnica de animação é deslumbrante e Zemeckis é talentoso o suficiente para criar momentos inspiradores.

Monday, October 16, 2006

O GRITO 2


Tem crítica minha de "O Grito 2" em www.cineplayers.com. Confiram.

Tuesday, October 10, 2006

DÁLIA NEGRA



Tem crítica minha de "Dália Negra" em www.cineplayers.com. Confiram.

Friday, October 06, 2006

"Na Minha Casa Não" no Blônicas.

Aquele texto meu "Na Minha Casa Não" foi publicado no site www.blonicas.zip.net. Entrem lá, o site é bem legal, cheio de textos de jornalistas e outros reconhecidos nacionalmente.

Reflexões de Nietzsche

Nunca é fácil acabar um relacionamento de quatro anos, mas Mauro estava bastante seguro. Pensava nisso há alguns meses e finalmente tomara a decisão definitiva.

- Apenas não dá mais – respondeu a um amigo, quando questionado sobre os motivos de tal atitude.

- Mas vocês sempre pareceram feitos um para o outro.

- Pois é. E o pior é que não tem motivo específico. Ela não me traiu, eu não me apaixonei por outra, ela não ronca nem rouba minhas cobertas na cama. Simplesmente não é mais a mesma coisa.

- E a Rosana? Como será que vai encarar? – indagava o amigo.

- Com certeza vai ficar mal. Sei que ela me ama e precisa de mim, mas não dá mais. Vai chorar no meu ombro e pedir para eu ficar, mas estou decidido – esclarecia Mauro.

- E vai fazer isso hoje mesmo?

- Sim, hoje à noite. Depois do expediente.

Mesmo com uma decisão dessa magnitude nas costas e o inevitável confronto emocional que o esperava logo adiante, Mauro desempenhou suas tarefas profissionais com dedicada precisão. Nada, em sua jornada de trabalho naquele dia, indicava estar prestes a encerrar uma relação que, um dia, significara tanto. Estava confiante e apenas lamentava o sofrimento pelo qual faria Rosana passar.

A caminho de casa, em seu carro, pensava na melhor maneira de iniciar a conversa. Apesar de não mais querer morar junto com Rosana, ainda gostava dela e, principalmente, respeitava-a. Quanto menos dor infligisse, melhor.

Mauro encontrou Rosana sentada no sofá da sala, lendo Cem Anos de Solidão e ouvindo jazz, com volume baixo. Ao perceber a presença dele, ela fechou o livro de García Márquez e se levantou, desligando o som. Não chegou perto de Mauro, passando longe da menção de um beijo de boas-vindas, atitude que, por sinal, ele retirbuiu.

- Oi, Mauro – disse Rosana, com certa indiferença na voz.

- Oi, Rô. Podemos conversar?

- Claro.

- Senta – falou Mauro, apontando para uma cadeira na mesa de jantar. Acomodou-se ao lado e prosseguiu: - É um assunto sério, Rô.

- Outro?

- Como outro?

- Também preciso conversar com você – falou Rosana, em tom sério.

Mauro foi surpreendido pela declaração dela. Qualquer que fosse o assunto de Rosana, certamente não era tão importante quanto o que ele tinha a dizer. Decidiu deixar ela falar primeiro.

- O que foi? Algum problema? – indagou, mais para que ela terminasse logo do que por interesse no tema.

- Sim – ela olhou para baixo e respirou fundo. Em seguida, encarou Mauro com olhos frios e sentenciou: - Estou deixando você, Mauro.

- Quê!? – espantou-se ele. – Como!? Quando!?

- Agora mesmo. Minhas coisas já estão todas ali – comentou Rosana, apontando para um conjunto de malas feitas parado ao lado da porta. Mauro ficou estarrecido por não ter notado aquilo antes.

- Mas... por quê!? – questionava ele, ainda abalado pela notícia. – Achei que estávamos bem.

- Ah, Mauro. Você sabe que isso não é verdade. Não estamos bem faz tempo.

- Mas podemos resolver! Em tudo dá-se um jeito! – exclamava Mauro, surpreso com sua própria reação.

- Não, Mauro, não agora. Não dessa vez. Só estou esperando o Emílio pra irmos – Rosana não exibia qualquer resquício de emoção na sua voz.

- Emílio!? Quem é Emílio!? – Mauro começava a se desesperar. – Por favor, Rô, me diga! Quem é Emílio!?

- Emílio é o cara quem eu tenho saído nos últimos meses. Vou morar com ele.

Mauro ficou atônito. Parecia em estado de choque. Olhos arregalados, boca escancarada e veias visíveis, prestes a estourar a pele. Tentou articular um último apelo ou reprimenda, mas a voz parecia ter refugiado-se em um abismo inalcançável. Permaneceu na mesma posição enquanto Rosana levantava da mesa.

Ela dirigiu-se à porta. Calmamente, serena, pôs a mão sobre o ombro de Mauro. Pela primeira vez na noite, sua voz exprimiu um pouco de doçura.

- Não há porque tornar isso mais difícil do que precisa ser. Adeus, Mauro.

Rosana juntou suas malas do chão e saiu, fechando a porta sem olhar para trás.

Mauro continuou sentado por uma quantidade de minutos que, tempos depois, quando lembrava do acontecido, jamais soube precisar. A mente era um turbilhão de imagens e lembranças e sensações. Ao contrário do que escreveram poetas ao longo dos anos, nada sentia no coração. Era mais para baixo que tomava-lhe algo estranho e incômodo, como se alguém revirasse seu estômago em busca de algo.

As lágrimas até então contidas vieram aos borbotões, acompanhadas de soluços que reverberaram por todo o cômodo. Esticou as mãos na direção da porta e disse, com a voz entrecortada pelo choro repleto de dor:

- Volta, Rô...

Mas ela não voltaria. Rosana partira para sempre, deixando-o solitário na companhia de seu orgulho ferido.

“Aquele que ama quer ser possuidor exclusivo da pessoa que deseja, quer ter um poder absoluto tanto sobre a sua alma como sobre o seu corpo, quer ser amado unicamente, instalar-se e reinar na outra alma como o mais alto e o mais desejável. (...) O amor é o mais nobre desejo de posse.”
Friedrich Nietzsche