Viagem Literária

Apenas uma maneira de despejar em algum lugar todas aquelas palavras que teimam em continuar saindo de mim diariamente.

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Location: Porto Alegre, RS, Brazil

Um gaúcho pacato, bem-humorado e que curte escrever algumas bobagens e algumas coisas sérias de vez em quando. Devorador voraz de livros e cinéfilo assumido. O resto não interessa, ao menos por enquanto.

Wednesday, August 26, 2009

SE BEBER, NÃO CASE! (THE HANGOVER)


Não vou escrever nada. Simplesmente assistam.

Jornada

Os caras lá da cidade em forma de avião estão avaliando reduzir a jornada de trabalho do pobre trabalhador brasileiro. Iria para 40 horas semanais, o que, para quem não trabalha finais de semana, dariam 8 horas de labuta diária. Claro que todos os trabalhadores devem estar curtindo a ideia, mas confesso que ainda não acho ideal. Pelo menos para mim.

Não que essa nova lei faça alguma diferença na minha vida. Na minha carreira de criativo publicitário, não existem horários. Juro que meu relógio arrebentou há uns quatro meses e não quis arrumar. Não faz diferença. A gente fica após o horário de saída sempre que preciso, o que é quase sempre, e sem ganhar hora extra por isso.

Mas pensemos em um mundo ideal, onde até os publicitários cumpririam horários. Seriam 8 horas diárias bastante ou pouco? Eu ainda acho que é muito tempo de trabalho para um só dia.

Acompanhem o raciocínio: 8 horas de trabalho mais, digamos, 1 hora de almoço. Somem isso ao tempo necessário para ir e voltar do serviço, o que vou colocar aqui como 1 hora e meia. Somente no tempo destinado ao trabalho, já se foram 10 horas e meia do dia.

Os doutores da medicina dizem que toda pessoa, para se sentir disposta, precisa de 8 horas de sono por dia. Aí já se vão 18 horas e meia. Acrescentemos meia hora de preparativos antes de dormir – como escovar os dentes e fazer quaisquer outras tarefas domésticas – e meia hora de tempo morto ao acordar – também escovando os dentes, tomando café, lavando o rosto, se vestindo e o que quer que se faça ao sair da cama. Só nessa minha conta já morreram 19 horas e meia do dia.

Claro que, exceto top models, também é preciso jantar. Então cortemos mais uns 45 minutos para o antes, durante e depois da janta. Já se vão 20 horas e 15 minutos. O que significa que, em um dia normal de trabalho, temos em média 3 horas e 45 minutos para nós mesmos.

3 horas e 45 minutos em um dia de 24 horas!

Nessa mísera parcela de tempo, temos que achar espaço para encaixar a parte boa da vida: sair com os amigos, assistir a um bom filme, ler um livro decente, namorar, passar tempo com a família e praticar hobbies como, sei lá, construir navios dentro de garrafas ou esculpir obras de arte.

Alguém tem a coragem de discordar que esse tempo é muito, mas muito exíguo? A vida de um adulto responsável não é fácil nem mesmo no descanso. Essas 3 horas e 45 minutos devem ser planejadas. Ou se assiste a um filme ou se sai para tomar uma cerveja. Ou se marca um encontro ou se dedica a um livro. Ou se joga videogame ou se joga futebol. É preciso selecionar. É injusto.

Defendo a ideia de trabalhar apenas durante a tarde, das 14h às 18h. Claro que é impossível, mas a utopia é minha e eu dou a ela o tempo que quiser. Pelo menos, assim a gente teria mais tempo para realmente aproveitar a vida e fazer aquilo que gosta.

Hoje, por exemplo, tenho bem menos do que as 3 horas e 45 minutos. Quem mandou querer escrever esse texto?

Thursday, August 20, 2009

Os males da manhã.

Acordar cedo é um saco.

Acordar cedo e ter que dirigir, pior ainda.

Acordar cedo e ter que dirigir para o trabalho, um verdadeiro terror.

Acordar cedo, ter que dirigir para o trabalho e, no caminho, se envolver em um acidente são as próprias labaredas do inferno dominando a Terra.

Passei por isso hoje de manhã. Ou melhor, quase isso. Felizmente, o choque entre os automóveis não ocorreu. Mas foi por pouco. Por milímetros.

O detalhe é que estava com o carro da minha mãe. Na verdade, sempre estou com ele quando acontece alguma merda. Começo a pensar que não deveria mais entrar naquele Ka. O meu veículo estava na oficina para alguns reparos e roubei o da minha genitora para o transporte matinal até a firma.

Tudo ia tranquilo até uns 2/3 do caminho, quando cheguei a uma avenida conhecida aqui em Porto Alegre como Oscar Pereira. Sua formação – ao menos no trecho que percorro pela manhã – consiste em uma grande subida e, como tudo o que sobe precisa descer, uma descida.

Estava eu na primeira parte. A avenida contém duas pistas – encontrava-me na da esquerda. Ouvia música com fone nos ouvidos, compensando a falta de rádio no carro da moça que me deu à luz. Seguindo a Lei de Murphy, minha fila de carros parou e eu, como motorista legal e obediente, levei os pés ao freio e igualmente brequei. O sono e a preguiça não me deixaram tentar trocar para a faixa da direita, ainda que esta estivesse mais tranquila.

Por precaução, olhei para o retrovisor. Nada de especial. Apenas uma camionete vindo na minha direção, mas muitos metros atrás. Facilmente, ela diminuiria a velocidade e pararia atrás do Ka, em um louvável respeito aos menores.

Engano meu.

A camionete seguia encurtando a distância sem reduzir. Eu permanecia olhando pelo retrovisor e pensando: “Hein?” Então, entendi as intenções do motorista do carro de trás. De súbito, sem qualquer aviso, ele jogou a camionete para a pista da direita, obviamente tentando aproveitar a faixa que seguia mais fluida.

Esqueceu, porém, de olhar pelo retrovisor.

Assim que a camionete fez menção de trocar de faixa, escutou-se um forte som de buzina. Este, claro, era do Clio que viajava lado a lado com ele. As leis da física comprovaram há muito tempo que dois corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço. Dois carros também não. O motorista do Clio enfiou a mão na buzina e o motorista da camionete se deu conta de que não poderia fazer o que queria. Voltou rapidamente para a pista da esquerda – só lembrando, a mesma na qual eu me encontrava.

A camionete estava a uns 80 km/h. Eu estava a 0 km/h. E a distância entre a imponente nave e a bunda do frágil Ka diminuía a cada milésimo de segundo. Àquele momento, devia estar em aproximadamente cinco metros.

Vi a tragédia. Antecipei o pavor. Os metros agora eram poucos. À minha frente, estava um Fiesta verde, provavelmente alheio do massacre que ocorreria atrás dele. Eu fiz a única coisa que pude. Com um olho no retrovisor e outro no carro adiante, acelerei o Ka até quase grudar no Fiesta. Dar o máximo de espaço para a camionete frear era meu único recurso. Este e, talvez, rezar.

Como não sou de levar muita fé no barbudo lá em cima, torcia. A camionete já tentava frear. O som da borracha dos pneus em atrito com o asfalto perfurava meu ouvido e me dava visões de um Ka completamente destruído. O monstro atrás seguia na tentativa de parar, mas continuava vindo para o abate.

Retesei-me. Firmei todo o corpo. Agarrei a direção com as duas mãos. A camionete devia estar a dois ou três metros. Felizmente, já diminuía.

No desespero pela impotência, no nervosismo de não ter o que fazer, comecei a buzinar. Não pensei. Claro que de nada adiantaria, mas precisava fazer alguma coisa. Só para aliviar a consciência. Só para poder dizer: “O Ka está reduzido a frangalhos, mas fiz o que pude”.

Era agora. Pelo vidro traseiro, nada mais se enxergava além daquele navio preto vindo em minha direção. Fechei os olhos, abracei a mim mesmo. Vi o filme de minha vida passar diante dos meus olhos. A prevalecida camionete vinha para patrolar o indefeso Ka. Só me restava aguardar.

Aguardei.

E aguardei.

Após alguns segundos, abri os olhos. “Isso é o paraíso?”, pensei. “Mas é muito igual ao caminho que eu faço todos os dias para ir ao trabalho”.

Então, percebi. Nada tinha acontecido. Olhei pelo retrovisor e, estática atrás de mim, estava a camionete. O aterrorizante carrasco jazia imóvel. Ainda ameaçador, mas parado. O motorista conseguira frear a tempo.

Respirei pela primeira vez desde o início de tudo. Tirei as minhas unhas que estavam cravadas no volante. Tentei ver quem dirigia o carro de trás. Pelo retrovisor, parecia uma jovem mulher, entre vinte e cinco e trinta anos. Loira, bonita até. Jogava as mãos pelos cabelos, aliviada por ter conseguido evitar a tragédia quase causada por ela mesma.

A única coisa que pude fazer foi erguer as duas palmas das mãos para o ar, como se perguntasse: “O que foi isso?”

Ela levantou uma mão, fazendo um sinal de desculpa. Era o mínimo.

Ignorante da catástrofe, o trânsito seguiu em frente. E eu, recém-saído da experiência de quase-morte, fui atrás.

Olhei pelo retrovisor. A camionete continuava parada. Provavelmente, a motorista psicopata estava petrificada, com medo de acelerar.

Dirigi-me ao trabalho. Durante todo o restante do trajeto, amaldiçoei ferozmente o homem que decidiu que acordar cedo era uma boa ideia.

Monday, August 17, 2009

ARRASTE-ME PARA O INFERNO


ARRASTE-ME PARA O INFERNO (DRAG ME TO HELL)
De Sam Raimi. Com Alison Lohman, Justin Long, Lorna Raver, David Paymer e Adriana Barraza.

Todo mundo começa de alguma forma. No caso de Sam Raimi, o início foi em meio ao sangue e à podreira. Antes de se tornar um diretor do grande escalão da indústria cinematográfica com a multimilionária série Homem-Aranha, Raimi se destacou em filmes de terror trash, mais especificamente A Morte do Demônio e Uma Noite Alucinante, nos quais uniu originalidade, criatividade, sangue e bom humor. Hoje transformadas em cult, as aventuras de Ash em meio aos mortos colocaram o nome de Raimi no mapa, oferecendo ao cineasta a oportunidade de construir sua carreira até chegar ao topo de Hollywood com as produções do aracnídeo.

Agora, dezessete anos após sua última incursão no gênero (O Dom da Premonição, de 2000, tinha uma proposta mais séria), Raimi retorna às origens com Arraste-me Para o Inferno. Escrito pelo próprio cineasta em colaboração com seu irmão Ivan Raimi, a produção conta a história de Christine Brown, responsável por aprovar empréstimos no banco onde trabalha. Disposta a mostrar ao chefe que tem pulso firme, Christine acaba negando o adiamento da hipoteca da idosa Sylvia Ganush. Como forma de vingança, Ganush joga uma maldição sobre Christine, na qual a garota será atormentada durante três dias por um espírito maligno antes de ser levada para o inferno.

Dois aspectos ficam claros logo nos primeiros minutos de projeção de Arraste-me Para o Inferno: primeiro, o objetivo de Raimi é prestar uma clara homenagem aos filmes de terror dos anos 80; e, segundo, a produção não deve ser levada a sério em momento algum. O próprio surgimento do logotipo da Universal já comprova a intenção do diretor em realizar algo que remeta à época de seus primeiros filmes, aproveitando a vinheta de abertura do estúdio que era utilizada naquele tempo. Esse “retorno” também pode ser percebido na forma com a qual Raimi compõe seus planos, utilizando-se de movimentos de câmera exagerados, zooms nada elegantes e outros artifícios que deixam de lado qualquer sutileza.

A opção de Raimi por essa estética camp/kitsch poderia ter transformado Arraste-me Para o Inferno em uma experiência insuportável e com cara de amadora, mas não é o que ocorre. Não se trata de um diretor sem talento inventando para mascarar sua inépcia ao contar uma história; pelo contrário, o que se vê aqui é um cineasta extremamente capaz divertindo-se com seu trabalho como parecia não fazer há algum tempo. Raimi apela para o exagero para construir um filme essencialmente trash, onde tudo é uma grande brincadeira, como fica claro em cenas como aquela na qual o sangue, ao invés de pingar, simplesmente jorra do nariz da protagonista, os momentos asquerosos envolvendo secreções que saem de uma boca e entram em outra e, claro, a sequência envolvendo uma bigorna – sim, uma bigorna!

Como resultado, ao invés de o espectador ficar os pouco mais de noventa minutos em estado de tensão, o que ocorre é que um sorriso brota no rosto e parece não sair mais. Há momentos de deboche total (como a dança que o espírito faz ao entrar no corpo do ajudante de San Dena) e, o que é realmente importante, todo o elenco parece se divertir junto com o cineasta ao brincar com o gênero. Alison Lohman, por exemplo, parece estar em conluio com Raimi no aspecto jocoso e interpreta Christine Brown no limite do histrionismo e da sátira – e o momento no qual procura o gato com uma faca na mão é um bom exemplo disso. Enquanto isso, Lorna Raver se destaca ao fazer da cigana Ganush uma criatura nojenta e repulsiva, mas sem deixar de lado o bom humor.

Mesmo que tudo não passe de uma grande “tiração de sarro” da parte de Raimi, é possível perceber que por trás das câmeras existe um cineasta com ótima noção de ritmo, enquadramento e, fundamentalmente, de cinema. O diretor constrói algumas cenas excelentes do ponto de vista técnico (como a da exumação do corpo) e caminha com tranquilidade sobre a difícil linha de usar o terror para fazer rir sem se tornar ridículo. Além disso, a opção por dar ao filme uma característica cômica o exime da culpa por utilizar clichês de terror, como os sustos dados com a trilha sonora, e até mesmo os descarados e nada convincentes efeitos digitais.

Em contrapartida, Arrasta-me Para o Inferno não atinge a originalidade que o cineasta apresentou em seus trabalhos iniciais. Dessa forma, o filme jamais passa de um passatempo rápido e bem conduzido, mas completamente esquecível assim que os créditos começam a rolar. Contribui também para o prazo de validade da obra o roteiro básico, sem grandes ideias, que ainda derrapa na previsibilidade ao tentar surpreender com reviravoltas óbvias que a plateia percebe muito antes do ideal.

No entanto, o resultado final é positivo. Arraste-me Para o Inferno pode não ser assustador como prometia, mas é aquilo que os norte-americanos chamam de “guilty pleasure”: um filme sem grandes qualidades cinematográficas, mas extremamente prazeroso de se assistir. O espectador que entrar na brincadeira certamente vai se divertir. Assim como parece ter sido para o próprio Sam Raimi nessa sua volta às origens.

Nota: 7.0

Thursday, August 13, 2009

Gripe do exagero.

Vou ser sincero com vocês: essa tal de nova gripe ainda não me pegou. Não digo o vírus em si, que também ainda não entrou nesse corpinho, mas falo sobre toda essa paranoia que tem tomado conta do povo por aí. Sei que é um problema sério, sei que já ocorreram muitas fatalidades, mas também sei que o negócio não é tão feio como muita gente pensa. Não vai ser uma nova gripe espanhola, não vai dizimar a população e só vai atingir quem não tomar o mínimo dos cuidados que os meios de comunicação não param de divulgar.

Mas o desespero parece generalizado. Tem gente tomando isso como o apocalipse final, o toque das trombetas, as nuvens se abrindo. Tudo isso me parece meio exagerado. Há alguns dias, um bando de assaltantes invadiu um banco usando máscaras. Eles roubaram o local com armas em punho, claro, mas acho que com todo o medo que cerca a sociedade eles nem precisariam de revólveres.

Imaginem comigo a cena: entram três homens em um banco. Os três usando essas máscaras de Michael Jackson (aliás, até nisso o Jacko estava à frente de seu tempo). O primeiro se dirige ao segurança, enquanto os outros dois anunciam aos berros:

- Atenção: isso é um assalto! Acabamos de sair do médico e está comprovado que estamos com a gripe suína. Se vocês não seguirem nossas ordens, vamos tirar as máscaras e cuspir na cara de cada um.

Não tenho dúvidas de que, no estado atual das coisas, todo mundo cederia. O pobre do vigia entregaria sua arma e os trabalhadores brasileiros nada fariam, pensando unicamente em evitar que o tal do H1N1 caminhe livremente por seus glóbulos. Se algum assaltante lê meu blog, fica a dica.

Há alguns dias, ouvi diversos amigos dizerem que não saem mais pra noite enquanto essa ameaça não estiver eliminada. Ainda não aconteceu comigo ou com alguém que conheço, mas já posso imaginar uma cena de paquera entre um homem e uma mulher nesses tempos de gripe A:

- Oi – diz ele. – Qual seu nome?

- Juliana.

- Você tem gripe A?

- Olha, acho que não.

- Alguém na família teve?

- Não que eu saiba.

- Alguém no trabalho teve?

- Também não.

- Então eu posso te beijar?

Claro, se ele não levar um tapa na cara pelo atrevimento, ela pode até gostar da ousadia e os dois viverem felizes para sempre. Ou, pelo menos, até a manhã do dia seguinte.

O grande problema de tudo isso é o exagero. Se cada um tomar as precauções necessárias, ninguém precisa se preocupar e mudar a rotina. Um pouco de cautela sempre é bom. Mas a paranoia pode ser uma doença fatal. Ainda mais que essa tal gripe.

Wednesday, August 05, 2009

Os Estranhos.

Existe na antropologia um conceito chamado pelo feio nome de etnocentrismo. De forma mais feia ainda, a definição simplista é a de que temos a tendência de julgar o grau de evolução e civilidade de outros povos e comunidades comparando-os com o ambiente no qual vivemos. Ou seja, para mim e para você, vivemos em um mundo urbano e repleto de facilidades, o que faz com que vejamos uma comunidade indígena como selvagem e atrasada.

Quem disse, porém, que a vida correta é a nossa? Quem disse que os atrasados são eles, e não nós? Para tal comunidade nativa, a existência em harmonia com o meio ambiente e vivendo unicamente com aquilo que é necessário pode ser ideal. Uma vida sem maiores preocupações além de ter o alimento e, possivelmente, um abrigo para passar a noite. Nada de necessidades supérfluas como enriquecer, ter o carro do ano ou viver sempre na correria de acordo com horários estabelecidos.

Não sou um especialista no assunto (e provavelmente qualquer antropólogo que ler essa minha definição de etnocentrismo acima vai se revirar fora do túmulo), mas acho esse um campo de estudo fascinante. Buscar a compreensão de como ainda podem existir conceitos de sociedade tão diferentes em mundo cada vez menos é algo que realmente pode fazer com que tenhamos outro olhar para nós mesmos e, principalmente, vejamos o próximo com mais tolerância.

Na capa do Terra, hoje, vi um caso desses que me deixou maravilhado. Era a foto tirada de avião de um pedaço de terra no meio da floresta. Em uma pequena clareira, um nativo pintado de vermelho apontava seu arco e flecha na direção da câmera/avião, provavelmente amedrontado/deslumbrado com aquele barulhento e imenso pássaro de metal. Uma imagem que parecia congelada no tempo, daquelas difíceis de encontrar ainda hoje no século XXI.

Se eles jamais tiveram contato com a civilização do “homem branco”, não sei dizer. O trecho da matéria, sobre a invasão do local na busca por petróleo e madeira, não deixava muito claro. Era, porém, o que parecia. O sentimento que a imagem passava era a de que dois mundos completamente opostos estavam colidindo ali mesmo, naquele instante. De um lado, uma sociedade intocada pela corrupção, vivendo apenas do essencial. Do outro lado, nós, impregnados de conceitos e ideias tão inúteis que chegamos a nos achar superiores aos tais “selvagens”. O encontro de um mundo que está destruindo o outro.

Quem está certo? Quem é mais evoluído? Não são essas as questões que deveriam ser levantadas diante de imagens como essa. Cada um vive ao seu modo e julgar a vida de outra pessoa – quanto mais uma comunidade inteira – não é papel nosso. Ao olhar de quem vive lá, os estranhos somos nós. Para nós, os anormais são eles. Cada um na sua. A grande questão é que eles não precisam de nós e do que nós temos. Então, por que pensamos que podemos tirar o que eles têm?

E essa pergunta, infelizmente, nunca teve e talvez nunca terá uma resposta.